O Doutrinador – Crítica
Quando em 2014, durante a Bienal de Quadrinhos de Curitiba, recebi um adesivo de um certo “novo herói”, brasileiro e caçador de políticos corruptos, confesso que não esperava que o circuito nacional, fosse dar uma chance para um longa com base em um quadrinho assim. Não por questão de qualidade, que por sinal a HQ tem de sobra. Mas sim, por se tratar de uma obra baseada em um quadrinho, uma mídia ainda pouquíssima aproveitada por aqui e muito menos levada a sério. Entretanto mesmo sem imaginar o que estaria por vir anos mais tarde, aqui estamos na estreia de O Doutrinador.
Para aqueles que não conhecem o trabalho de Luciano Cunha, autor da HQ, O Doutrinador, acompanha a história de Miguel, vivido no longa, por Kiko Pissolato, um agente federal de elite, que ao ser atingido por uma tragédia familiar, resolve fazer justiça com as próprias mãos, tendo como alvo toda uma casta corrupta de políticos. De dia, vivendo como policial e a noite agindo como um justiceiro, levando sua vingança até as últimas consequências.
Seguindo o estilo principalmente de Tropa de Elite 2 e a série O Mecanismo, o Doutrinador, trás em seu DNA uma gigantesca dose de crítica social, expondo, mesmo que sem citar nomes e levando tudo para o aspecto da ficção, vários casos de corrupção e trazendo para as telas toda a indignação do povo contra todos os casos recentes que assolaram o país. Tudo isso sem fugir de influências muito assertivas no que diz respeito a ação e até mesmo referenciando quadrinhos e outros produtos, como Watchmen, Demolidor e o próprio Justiceiro.
Que o Brasil já acerta a mão no valor de suas produções, não é de hoje que sabemos, todavia, vale um destaque para o arranjo deste longa. Tomadas aéreas arrebatadoras, locações dignas e uma fotografia simplesmente inspirada. E sendo um filme de herói, a trilha sonora não poderia ficar em segundo plano. Variando entre heavy metal, rock, punk e rap, cada momento grandioso tem uma trilha apropriada, imersiva e relevante, tudo contribuindo e prendendo o expectador.
Entretanto, se o longa apresenta algum defeito, está na direção de Gustavo Bonafé. Sem conseguir tirar o máximo de alguns atores, diversas cenas chaves perdem força, talvez a imagem que deveria ser a mais impactante e triste da produção, não leva o expectador junto, não traz tristeza, apenas indiferença e o incomodo pelo tempo que a cena dura. A falta da habilidade em proporcionar empatia não é o único problema, o roteiro de Gabriel Wainer tem a capacidade de apresentar um início arrebatador, mas falha na passagem do segundo para o terceiro ato. Muitas reviravoltas acontecendo em pouco tempo parecem adiar a inevitável conclusão do arco, tudo isso contribui para que o filme se torne longo demais.
De maneira geral, O Doutrinador, não é o suprassumo das produções cinematográficas brasileiras, mas dá um passo importante para a valorização das nossas HQs. O Brasil produz muito quadrinho de qualidade e quase todos dariam uma ótima história para o cinema, basta querer olhar.
No mais, para aqueles que quiseram continuar acompanhando a história do herói, O Doutrinador ganhará uma série, prevista já para o próximo ano. Para agora, fica apenas o desconsolo de não ver a discussão que esse filme traria, se tivesse estreado antes das eleições de 2018, e não apenas após o segundo turno.