Crítica: Jogador Nº 1
Em “Jogador Nº 1”, Steven Spielberg volta com tudo, resgatando a época em que concebia blockbusters divertidos, visualmente impressionantes, com uma trilha sonora memorável e, acima de tudo, com uma boa história a ser contada – cortesia de Ernest Cline.
Sempre que pensarmos em cultura pop dos anos 80, o nome Steven Spielberg vai aparecer. O cineasta é responsável por ícones que são verdadeiros pilares na formação de qualquer nerd. A lista é imensa: “Tubarão”, “E.T. – O Extraterrestre”, “Indiana Jones”, “Os Goonies”, e muitos outros. Porém nos últimos anos ele vem trabalhando com filmes mais dramáticos, deixando um pouco de lado aquele tom de Sessão da Tarde.
Não poderia haver filme mais propício para trazer de volta aquele Spielberg raiz do que “Jogador Nº 1”. Fica claro que o filme não é totalmente fiel à obra de Ernest Cline, ele é uma história contada a partir de uma inspiração adquirida do livro, e isso está longe de ser um defeito, já que muitas adaptações fazem com que o filme se torne praticamente uma obra independente da história em que foi inspirado. Até porque, seria muito difícil conseguir todos os direitos das referências presentes no livro. Mesmo assim o diretor abusa das referências da forma que pode, chegando inclusive a referenciar seus próprios títulos.
A história se passa em 2044 e acompanha Wade Watts, um jovem que, assim como a maioria da população, foge da realidade em uma utopia virtual chamada OASIS. Seu já falecido criador – James Halliday – deixou lá dentro uma série de easter eggs baseados em elementos da cultura pop oitentista, que levam a alguns desafios. Estes desafios levam a três chaves diferentes, e aquele que conseguir todas elas se tornará o herdeiro de Halliday, o que inclui todos os seus bens, inclusive os direitos sobre o OASIS – no maior estilo “A Fantástica Fábrica de Chocolate”. Naturalmente, isso atrai uma série de competidores, que atuam sozinhos (como Wade) ou em equipe. Uma corporação gigantesca, chamada IOI, também entra na corrida.
Se no livro já era difícil acompanhar todas a referências que o escritor nos apresenta, no longa é impossível descobrir todas elas vendo o filme apenas uma vez. Muita coisa que no livro é descrita minuciosamente – e chega a cansar alguns leitores – está em pequenos detalhes nos cenários do filme, seja numa capa de disco, num cartaz ou num personagem lá no fundo. O mais interessante é que em nenhum momento existe uma “forçação de barra” entre as milhares de interações dos personagens com as referências externas. O transporte das invenções narrativas de Cline para o mundo audiovisual do cinema impressiona. A viagem que Spielberg nos proporciona ao adentrar pela primeira vez no Oasis é sensacional. Criada como uma realidade virtual sem limites, com efeitos especiais de tirar o fôlego, o diretor brinca com a nossa percepção o tempo todo e traz de volta a verdadeira necessidade dos famigerados óculos 3D, algo visto pela última vez apenas em “Avatar”.
As atuações são bem convincentes, o protagonista consegue transmitir o mesmo carisma do Wade Watts do livro, e Ben Mendelsohn aprendeu como se faz um bom vilão em “Rogue One – Uma História Star Wars”. O filme dá muito mais espaço para a personagem Art3mis na trama. Mesmo sendo tão ou mais qualificada do que qualquer outro gunter (nome dado aos caçadores do easter egg), ela não possui tanto espaço para mostrar sua autossuficiência no livro. Aqui, ao contrário do conto de Ernest, ela ganha o destaque que merece, fazendo grande diferença tanto dentro do jogo como no mundo real. Os demais personagens dos Cinco do Topo (Aech, Daito e Sho) ganham um pouco menos de espaço, mas não deixam de ter bons momentos.
Por fim, “Jogador Nº 1” é diversão garantida para os diferentes tipos de nerd, da nova e da velha geração. É um tributo aos anos 80, um espetáculo visual – por sinal, vejam na maior tela possível – com uma trilha sonora maravilhosa e uma história que dá abertura para pequenas – porém importantes – reflexões. Aproveitem o fantástico, mas sem deixar de valorizar o mundo real.