E SE…O ESCOLHIDO TIVESSE SIDO NEVILLE?
Neville Longbottom tem muitos admiradores entre os fãs da série, e não é pra menos. A profecia que consagrou Harry Potter como menino que sobreviveu, o escolhido que possui o poder de derrotar o Lorde das Trevas, se aplicava também a Neville.
Pois é, aquele menino gordinho, desengonçado e todo atrapalhado que você conheceu por pouco não foi o escolhido.
Aí vem a pergunta: se Neville fosse o escolhido ele seria capaz de derrotar Voldemort?
Bom, vamos por partes. Primeiro você precisa entender a profecia:
“Aquele com o poder de vencer o Lorde das Trevas se aproxima…nascido dos que o desafiaram três vezes, nascido ao terminar o sétimo mês…e o Lorde das Trevas o marcará como seu igual, mas ele terá um poder que o Lorde das Trevas desconhece…”
Dois meninos se encaixavam na descrição: Harry Potter e Neville Longbottom. É curioso o porque de Voldermort ter escolhido o mestiço, Harry, ao invés do puro sangue Neville. O motivo nós nunca saberemos, mas ao fazer sua escolha, o Lorde definiu quem seria o seu inimigo mortal.
Partindo desse ponto, precisamos observar que a evolução de Neville durante todos os livros é louvável. Ele começou como um menino gordinho, desengonçado e pelo qual ninguém dava nada, mas terminou sendo uma peça fundamental na guerra contra o mal. De fato, Harry precisa dele para vencer a batalha em Hogwarts.
Veja bem, J.K Rowling traça um paralelo com a geração antiga ao apresentar a aventura de Harry e seus amigos. Os marotos marcaram época na escola de magia e bruxaria, Tiago Potter, o pai de Harry, também foi um excelente apanhador, um tanto quanto inflexível e líder nato. Rony Weasley é Sirius Black, confuso sobre si próprio, engraçado e, sobretudo, um amigo fiel. Hermione Granger é Remus Lupin, inteligente, meticulosa, intuitiva e com a cabeça no lugar. Ginny Weasley, é claro, seria Lily Evans (mãe de Harry), brincalhona esperta e gentil. E o inimigo natural de Harry, Draco Malfoy, seria Severo Snape; pretencioso, com um ego frágil e o senso de certo e errado quando lhe convém.
E você se pergunta, onde Neville se encaixa nisso tudo? Pois bem, eu vos digo: Neville Longbottom seria Pedro Pettigrew, o traidor responsável pela ruína da família Potter. Mas calma lá que a trajetória dele acaba sendo bem diferente (graças a Merlin!).
Veja bem, ele é o amigo que admira o trio mas todos o veem como um problema sem talento nenhum. Ele conhece vários segredos de Harry e poderia facilmente dar uma de dedo duro. Ele também é sangue puro, mas não dá qualquer importância a essa história de famílias bruxas tradicionais. Ele é o elo fraco, ingênuo a ponto dos outros estudantes caçoarem dele, principalmente quando Harry e seus amigos não estão por perto para ajudar. Viu só? Ele é o Pettigrew da nova geração.
Aliás, poderia ter sido, ele é o exemplo perfeito de como um ingrediente pode estragar o prato principal ou torná-lo inesquecível. Mas ele é o coringa do tabuleiro, aquele que vira o jogo. Ele está sim na mesma posição que Pettigrew se encontrava anos atrás, mas tomou todas as decisões que Pedro não teve coragem de tomar. Vários personagens se encontram nessa situação no decorrer da história, mas nenhum deles chegou tão longe quanto Neville.
Harry precisa de Neville, da mesma forma que Tiago, Sirius, Lily e a Ordem da Fênix precisaram de Pedro. Mas Neville tinha a força necessária para cumprir essa missão.
No geral a sociedade insiste em nos dizer que apenas pessoas como Harry e seus amigos, os principais e líderes natos, tem valor, e pessoas como Longbottom são esquecidas, tal qual foi o seu primeiro ano em Hogwarts. Entretanto a baixa autoestima e falta de confiança viraram força de vontade para melhorar suas habilidades e uma insistência de sempre ajudar os outros, mesmo quando estes não pedem. Pettigrew carregou suas fraquezas durante toda uma vida. Ele passou de admirador de Tiago e Sirius a admirador e seguidor fiel de Lord Voldemort. Ele sempre foi a ovelha, seguindo quem falava mais alto na sala. Suas ações são justificadas por uma desculpa simples, e fácil de ser acreditado até por si mesmo: “Você-Sabe-Quem tinha tanto poder! Não havia outra escolha que fazia sentido”. Ao que Sirius brada que preferiria a morte a trair seus amigos, mas a questão é que Pedro não queria morrer.
O primeiro ato de heroísmo de Neville é uma perfeita justaposição aos erros de Pedro, ele se volta contra Harry, Rony e Hermione em A Pedra Filosofal, enfrentando-os. Tal ato de bravura é reconhecido por Dumbledore, que concede a ele pontos que fazem a Grifinória vencer a Copa das Casas.
Enquanto Pettigrew vive sempre às sombras dos outros, – McGonagall se lembra dele apenas como o garoto que seguia Tiago e Sirius – Neville mostra que tem potencial de ser um oponente à altura do perigo apresentado.
Acima de tudo, Neville é sempre aquele que mantém a esperança, estando ao lado de Harry mesmo quando ninguém acredita ou dá importância ao que ele diz. Não podemos esquecer que durante Harry Potter e as Relíquias da Morte, com a ausência de Harry, Rony e Hermione, quem manteve a Armada de Dumbledore ativa em Hogwarts foi ele. Essa responsabilidade foi assumida por ele, sem que ninguém pedisse ou ordenasse. Seu trabalho acaba por ser um dos mais difíceis de todos, ele também abriga refugiados na sala precisa e faz com que todos fiquem cientes de que a Armada de Dumbledore ainda está ativa e funciona a todo vapor. Toda grande história precisa de um personagem que não desiste nunca, nem no pior dos cenários, e isso é o que Neville faz o tempo inteiro. Mesmo seus amigos tendo sido sequestrados, torturados e muitos estando desaparecidos, ele continua em Hogwarts mesmo quando dois de seus professores são Comensais da Morte. Ele mantém a chama da esperança acesa para Harry, Rony e Hermione voltarem e lutarem. Se ele não tivesse feito isso a batalha de Hogwarts poderia nem acontecer.
Provavelmente você vai pensar que pelo fato dos pais de Neville terem sido torturados até a loucura isso impediria que ele cogitasse sequer ir para o lado do mal, mas Pedro também tinha uma família que com certeza ficaria horrorizada com suas ações. E pior, ao fingir sua morte Pettigrew fez a mãe acreditar que ele morreu como um herói. A história de Neville é totalmente oposta a de Pedro, em inúmeros sentidos, o nosso quase escolhido luta por uma família que não é mais presente e procura deixar seus pais orgulhosos, mesmo que eles nunca venham a ter conhecimento do que sequer é isso.
Por fim, Neville tem a oportunidade de fazer a mesma escolha covarde de Pettigrew: seguindo o caminho mais fácil e se juntando a Voldemort. Mas é aí que ele puxa a espada de Gryffindor de um jazido Chapéu Seletor em chamas e dá fim a última Horcrux, a cobra Nagini. Não é possível que seja mais claro: Harry precisa de Neville para terminar essa guerra, tanto quanto ele precisa de Ron ou de Hermione, tal qual seus pais precisavam de Pedro.
Neville não se importou com o quanto ele era pequeno ou sem importância perante os outros, essa foi a sua força e que deu o combustível necessário para ele fazer o que precisava ser feito, não quando era difícil, mas sim porque era difícil.
Tal distinção mostra que Neville é o mais verdadeiro dos Grifinórios, sendo um ponto de equilíbrio inesperado para a narrativa de Harry Potter. Quem Pedro Pettigrew teria se tornado se ele tivesse entendido que coragem não é seguir alguém cegamente, mas sim fazer o que é necessário, mesmo quando ninguém pede.
A própria J.K Rowling se pronunciou sobre o personagem em 2005:
“Qual a importância de Neville ter sido o outro garoto sobre o qual a profecia poderia ter se referido?
Finalmente eu vou responder a essa enquete! Me desculpem por ter demorado tanto, mas deixe-me começar dizendo como eu estou feliz por essa pergunta ter ganhado, porque era a que eu mais tinha vontade de responder. Alguns de vocês podem não gostar do que irei dizer – mas eu cuido disso no fim da resposta!
Para recapitular: Neville nasceu no dia 30 de julho, um dia antes de Harry, e ele também nasceu “quando o sétimo mês morre”. Seus pais, que eram aurores famosos, haviam “por três vezes desafiado” Voldemort, assim como Lilian e Tiago. Voldemort tinha, portanto, que escolher entre dois bebês aos quais a profecia se aplicaria. Porém, ele não percebeu completamente as implicaçãoes de atacá-los, porque ele não havia ouvido a profecia inteira. Como Dumbledore diz:
“Ele [o informante] ouviu somente o começo, a parte que previa o nascimento de um garoto em julho cujos pais haviam desafiado Voldemort três vezes. Consequentemente, ele não pôde avisar seu senhor que atacar você seria um risco de transferir poder a você.”
Com efeito, a profecia deu a Voldemort dois candidatos para seu grande inimigo. Ao escolher qual garoto assassinar, ele também (sem perceber) escolheu qual garoto seria O Escolhido – ao lhe conferir ferramentas que nenhum outro bruxo possui – a cicatriz e a habilidade dela, uma janela mágica para a mente de Voldemort.
Então o que haveria acontecido se Voldemort tivesse decidido que o puro sangue, não o mestiço, fosse a maior ameaça? O que teria acontecido se ele tivesse atacado Neville? Harry pensa nisso durante ‘Half-Blood Prince’ e conclui, acertadamente, que a resposta depende da possibilidade, ou preparação, dos pais de Neville a morrer por ele, do modo que Lilian morreu por Harry. Se não tivessem, Neville teria sido morto. Se Frank ou Alice tivessem se jogado na frente de Neville, porém, o feitiço teria voltado exatamente como aconteceu no caso de Harry, e Neville teria sobrevivido com uma cicatriz em forma de raio. O que isso quer dizer? Um Neville com uma cicatriz em forma de raio teria sido tão eficaz em escapar de Voldemort como Harry vem sendo? Teria Neville as qualidades que possibilitaram a Harry permanecer forte e são durante suas provações? Apesar de Dumbledore não admitir, ele não pensa assim: ele acredita que Voldemort escolheu o menino que de fato seria o com a maior chance de derrotá-lo, pois a sobrevivência de Harry não dependeu inteiramente, ou até principalmente, de sua cicatriz.
E onde isso deixa Neville, o garoto que quase foi Rei? Bem, isso não lhe dá poderes secretos ou um destino misterioso. Ele continua um jovem bruxo “normal”, porém um com um passado, de certa maneira, tão trágico quanto o de Harry. Como vocês viram em ‘Ordem da Fênix’, Neville tem seus poderes. Ainda veremos como ele se sentirá se ele algum dia descobrir como quase foi O Escolhido.
Alguns de vocês, que ficaram convencidos de que a profecia marcou Neville, de algum jeito místico, com um destino mesclado ao de Harry, podem achar essa resposta um pouco vazia. Porém, estava tentando argumentar algo importante sobre Harry e Voldemort, e sobre profecias em si, ao mostrar Neville como um candidato. SE nenhum garoto estivesse previamente marcado, antes do ataque de Voldemort, para ser seu possível inimigo, a profecia (como aquela que as bruxas fazem a Macbeth, se alguém leu a peça homônima) se torna o catalisador para uma situação que nunca teria acontecido se ela não tivesse sido feita. Harry encontra-se em uma situação aterrorizante pela qual ele poderia nunca ter pedido, enquanto Neville permanece o angustiante “quase-foi-escolhido”. Destino é um nome muitas vezes dado às escolhas que têm conseqüências dramáticas.
Claro, nada disso significa que Neville não tem um papel importante nos últimos dois livros, ou na luta contra Voldemort. Quanto à profecia em si, ela continua ambígua, não apenas aos leitores, mas também aos meus personagens. Profecias (pensem em Nostradamus!) normalmente têm muitas interpretações. Essa é tanto a fraqueza quanto a força delas”.
Depois de toda essa explicação você tem alguma dúvida de que Neville não é só um personagem complexo, mas que se ele tivesse sido escolhido pelo Lorde das Trevas, no lugar de Harry, com certeza conseguiria enfrentar todos os algozes e provações que seriam colocados em seu caminho? Tal qual Harry. Ele seria um herói ainda maior do que já é.
Encerro com a célebre frase dita por Neville para Voldemort, que transpira o espírito de Godrico Gryffindor: “Me unirei a você quando o inferno congelar! Armada de Dumbledore!”. Que orgulho desse menino.