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Crítica – Anora

Em Anora, filme vencedor da Palma de Ouro em 2024, Sean Baker apresenta, mais uma vez, uma versão crua, visceral e até mesmo um tanto cômica, do conto da Cinderela ao mergulhar em nossa continua capacidade de se iludir com uma improvável, e quase magica, virada que pode mudar totalmente a nossa vida.

Quem conhece o trabalho do diretor, sabe bem que suas produções constantemente abordam a falácia do inalcançável sonho americano. Aqui, colocado em um contraponto claro, entre aqueles que nunca tiveram nada e apenas sonham, e aqueles que sempre tiveram tudo e ainda são capazes de se aproveitar de uma esperança quase ingênua.  

Na história acompanhamos Anora (Mikey Madison), que trabalha como stripper e acompanhante de luxo, e acaba conhecendo um inconsequente jovem russo, Vânia (Mark Eydelshteyn), filho de um poderoso oligarca, que acaba contratando os serviços da garota com exclusividade por uma semana. Ao fim de uma jornada de excessos o jovem acaba pedindo Anora em casamento. Mas é apenas na volta para casa que a garota vai precisar lidar com a realidade da situação, afinal, se casou com um jovem inconsequente que é custeado pela família que jamais aprovará a união.

A visão do diretor, somado a um ritmo de montagem perfeito, fazem com que a produção flutue entre o drama e a comédia escrachada de absurdos. O choque de realidade entre dois mundos tão distintos, arranca risos sinceros do público mascarando um sentimento de tensão inevitavelmente crescente, que desagua muito mais do que apenas em um critica social pertinente, mas também em uma ótima história para se acompanhar.

Logicamente é fácil traçar um paralelo com “Uma Linda Mulher”, produção estrelada por Julia Roberts, entretanto aqui, Baker trabalha com os pés mais cravados no chão. O longa explora uma jornada divertida, empolgante e instigante. Quase mágica. Mas conclui seu conto com uma solidez crua, digna de um mundo real e melancólico, descontruindo qualquer fundamento de ilusões que ainda possam restar na personagem.

O destaque, é claro, fica por conta de Mikey Medison. A atriz, literalmente, traz um brilho quase mágico ao papel de protagonista. Papel esse, inclusive, que exige uma bagagem emocional intensa, afinal, orbita entre a comédia e o drama a todo momento. O talento da atriz confere a personagem titulo uma primeira impressão impossível de se ignorar, ou até mesmo esquecer.

No fim, Anora, ganha destaque ao retratar o drama como comédia e usar o riso para esconder a tristeza. Uma produção que poderia optar por contar uma história muito mais simples, escolhe as entrelinhas para expor feridas sociais, enquanto envolve o espectador com um conto de fadas. Ao acender das luzes o que sobra, é um gosto agridoce nos lábios e muito a ser digerido.   

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